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A Pandemia não resistiu às eleições



Luis Eduardo Neves Doutorando em Geografia e professor da UFMA


Yuri Costa Doutor em História, professor da UEMA e defensor público federal


Upaon Açu - A campanha eleitoral não seria capaz de acabar com o coronavírus. Impressiona, no entanto, a rapidez com que as eleições vindouras destroem a coerência do discurso do cuidado com a saúde coletiva no atual contexto de crise sanitária. Independentemente do que até aqui foi sustentado publicamente quanto ao combate à Covid-19, o desrespeito ao distanciamento social e o incentivo às aglomerações aproximaram diferentes siglas partidárias.


A última semana foi marcada pela realização de convenções que oficializaram o lançamento

de nomes para concorrer ao pleito municipal deste ano. Com exceções pontuais, talvez

levadas a cabo bem mais pelo tímido número de apoiadores que pela preocupação com a

pandemia, o que se observou foi um completo desrespeito e descaso com as normas

básicas de prevenção ao contágio pelo coronavírus.


No Maranhão, onde normas estaduais e municipais acertadamente ainda proíbem

aglomerações e restringem a realização de uma série de eventos, preocupa bastante o

recado dado pelas multidões chamadas às convenções partidárias. Mais do que isso, as

aglomerações demonstram os limites da coerência e do real compromisso com a população

por parte de políticos que ocupam hoje cargos públicos e dos que pretendem ocupar.


Passeatas numerosas, auditórios e ginásios lotados e mesmo mega produções

comparáveis a shows de popstars. O início da campanha eleitoral não poupou formas de

incentivar a reunião das massas. As aglomerações foram uma marca dos lançamentos oficiais de campanha, tanto em São Luís quanto em diferentes municípios do interior do Maranhão.


Não faltaram ao encontro pessoas que compõem os já conhecidos grupos de risco à Covid.

Foram perceptíveis críticas às aglomerações desnecessárias e irresponsáveis incentivadas

pelas coligações partidárias, algumas delas registradas em comentários nas transmissões

ao vivo dos eventos pelas redes sociais.


As respostas dadas por apoiadores dos candidatos, também na forma de comentários, quando não ofensivas aos que questionavam as aglomerações, foram infundadas. “Mas todos estão de máscaras!” ou “os outros candidatos também realizaram aglomerações!”.


A primeira talvez se baseia numa propriedade das máscaras ainda desconhecida pela epidemiologia, que a torne suficiente para impedir o contágio. A segunda se fundamenta na ideia falaciosa de que o erro de todos produz alguma espécie de acerto.


Os mesmos candidatos que se passam por modernos, pautando sua campanha pelo brilho

reluzente da própria imagem nas redes, com intensa influência digital, não resistiram à

velha política do palanque e das bandeiras. Gestores que se proclamam exemplos para o

Brasil no combate à pandemia cederam ao discurso que menospreza a crise sanitária,

portando-se de forma absolutamente contrária ao que pregam à população em geral.


Se por um lado as aglomerações vistas recentemente são apenas o começo de meses de

campanha eleitoral, por outro já bem demonstram o tom hipócrita e mesquinho que está por

vir. Por certo, o discurso de combate à pandemia não sobreviveu ao primeiro momento das

candidaturas. A ética e a coerência entre discurso e ação, tão raras na vida política

brasileira, foram mais uma vez golpeadas pelos interesses eleitoreiros, dessa vez por meio

do desprezo à pandemia, da desconsideração da saúde pública e do desrespeito aos

grupos vulnerabilizados pela Covid-19.


O início da corrida eleitoral no Maranhão aproximou conservadores e progressistas.

Políticos que se apresentam como novidade e os já tradicionais, no fundo, parecem

compartilhar de uma coisa em comum, o desejo pelo poder, que, nas palavras do antigo

filósofo grego Epicteto, é algo perigoso para debutantes.


*Texto originalmente publicado no jornal o Estado do MA e disponibilizado pelos autores ao Rumbora Marocar

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