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Diogo Diniz Ribeiro Cabral

Racismo estrutural e as eleições municipais de São Luís


Diogo Diniz Ribeiro Cabral

Advogado Popular, especialista em Direitos Humanos.

Associado na Sociedade Maranhense de Direitos Humanos




O Maranhão é um estado cuja população rural e urbana é majoritariamente negra. De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 76,2% dos maranhenses são negros. Contudo, em que pese constituir em maioria absoluta de todas as cidades do estado, sobretudo negros e negras são submetidos a gravíssimas violações de direitos humanos cotidianamente. Nesse sentido, de acordo com o IBGE, apenas 28,2% de negros de 18 a 24 anos vão à escola no Maranhão.


Outro dado alarmante se refere ao percentual de negros que vivem na extrema pobreza no estado. Em 2018, entraram na extrema pobreza no Maranhão, segundo dados revelados IBGE, 1.397 milhão de pessoas. Desse total, 1.197 milhão se declararam pretos ou pardos, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua.


O número de pretos/pardos representou, dentro dessa população, é de 85,8%. A pesquisa aponta que milhões de maranhenses negros e negras sobrevivem com míseros R$ 145,00 (cento e quarenta e cinco reais) por mês. Na capital, São Luís, há 83 mil pessoas nessa situação desumana, sendo que 14,5% são brancos e 84,3% são pretos/pardos.


Uma outra disparidade revela profundas diferenciações relacionadas a salários recebidos por negros e brancos no Estado. O IBGE aponta que em 2018, a população branca do Maranhão recebia 36% a mais que as pessoas pretas ou pardas. O instituto revelou ainda que o rendimento médio dos brancos era de R$1.588, enquanto dos pretos ou pardos era de R$1.168 – uma diferença de R$ 420.


A Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, na Nota Técnica “O extermínio da juventude negra no Maranhão”, aponta que, no Maranhão, temos um amplo predomínio de homens (92,9%), negros e jovens dentre as vítimas de mortes matadas no período 2000-2012. Os negros constituem 76,2% da população maranhense (Censo de 2010), mas representaram 85% das vítimas fatais no período 2000-2012. Nesse mesmo período, o Estado apresentou o 3º maior crescimento do país na taxa de homicídios da população jovem (184,5%), abaixo apenas do Rio Grande do Norte (293,6%) e Bahia (249%). Na população total, a taxa de homicídios de brancos cresceu 98,4%, enquanto a taxa de homicídios de negros subiu 165,2%. Proporcionalmente, em 2012, para cada pessoa branca morta foram mortos 2,4 negros.


Os dados acima apresentados revelam que nosso estado e nossa sociedade é ancorada e pautada pelo racismo estrutural (na formação sócio-histórica brasileira o racismo é um dos componentes que fundamenta as relações) sociais , que segundo Grada Kilomba, se configura quando pessoas negras são excluídas da maioria das estruturas sociais epolíticas, e as instituições agem na perspectiva que privilegiam os/as brancos/as e mantém suas vantagens em detrimento as vidas negras.


Tal estrutura violenta, que mantém privilégios de uma minoria e promove severas violações de direitos humanos, é muito bem representada quando analisamos a totalidade dos Planos de Governo dos candidatos à prefeitura de São Luís. 


Dos 10 candidatos que disputam a Prefeitura de São Luís, 08 destes apresentam alguma medida de combate ao racismo em seus planos de governo, os quais apresentamos:


O candidato Bira do Pindaré (PSB), em seu Plano de Governo, apresenta diversas propostas destinadas ao combate ao racismo. O mesmo declara que dentre seus princípios de gestão municipal está o combate às desigualdades em todas as suas dimensões e como visão de futuro para São Luís uma Cidade democrática, igualitária, inclusiva e antirracista. Dentre suas diretrizes gerais, aponta a promoção da igualdade racial, com ações afirmativas em todas as áreas das políticas públicas.


Dentre seus compromissos de governo, apresenta o Programa Vidas Negras Importam, com várias ações principais, dentre as quais viabilizar reserva de vagas para a população negra em concursos públicos municipais, ampliar o acesso da população negra às políticas públicas de saúde, educação, cultura, esporte e lazer, moradia e formação profissional, entre outras, criar a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, com orçamento próprio, elaborar plano de prevenção à violência e proteção da juventude negra.


O candidato Eduardo Braide (PODEMOS) apresenta como única proposta a implantação de políticas públicas municipais de ações afirmativas, destinadas à promoção da igualdade racial e contra qualquer tipo de discriminação.


O candidato Franklin Douglas (PSOL), em seu Plano de Governo, apresenta diversas propostas destinadas ao combate ao racismo, dentre a quais destacamos a criação da Secretaria Municipal de Promoção da Igualdade Racial, com autonomia orçamentária, programa próprio e incidência nas políticas das demais secretarias, o fortalecimento da participação das populações negras e o Conselho Municipal das Populações Afrodescendentes, a partir da Conferência Municipal de Promoção da Igualdade Racial e do Fundo Municipal, o incentivo ao afroempreendedorismo, desde a moda e costura até a imagem e estética, a implementação da Lei 10.639, para incorporar a História da África, incorporando autores negros e negras à sala de aula, e às bibliotecas municipais, viabilizar um centro de referência da Mulher Negra, como espaço de formação, vivência e arte voltado às mulheres.


O candidato Hertz Dias (PSTU), em seu Plano de Governo, apresenta algumas propostas programáticas destinadas ao combate ao racismo, dentre as quais destacamos a luta contra a opressão e exploração das mulheres, dos jovens, negros e homossexuais, salário igual para trabalho igual e exigências de programas de igualdade salarial e de oportunidades de contratação e ascensão profissional para mulheres, negros e homossexuais.


O candidato Jeisael Marx (REDE), dentre suas diretrizes de governo, apresenta como proposta a escuta e o incentivo ao protagonismo da juventude, dos afrodescendentes, das mulheres, das comunidade LGBTQIA+ para o estabelecimento de políticas de equidade e de promoção da igualdade das mulheres, da igualdade racial e a inclusão social dos negros e negras, das pessoas com deficiência, dos direitos dos gays, lésbicas, bissexuais, transexuais e travestis, sua inclusão social e o combate à homofobia.


O candidato Neto Evangelista (DEM) apresenta como proposta de combate ao racismo, dentre seus princípios de gestão, garantir igualdade de oportunidades para crianças, jovens, negros, mulheres e idosos. Igualmente, dentre as ações de governo, apresenta a proposta de redução das desigualdades e garantia dos direitos difusos, atuando de forma participativa e consistente pela redução das desigualdades e pela promoção da identidade plural no município, a partir da criação da Secretaria de Direitos Humanos e com foco em garantir a transversalidade das pautas relacionadas à comunidade negra, indígena e demais grupos étnicos da cidade, bem como a representação de questões de gênero, LGBTI+ e acessibilidade nas políticas municipais, promovendo ações afirmativas e regulamentando instâncias voltadas para garantia dos direitos difusos no município.


O candidato Rubens Júnior (PCdoB) apresenta como propostas de combate ao racismo a criação da Secretaria Municipal de Igualdade Racial para promover a articulação de políticas, garantindo inclusive Ações Afirmativas no Serviço Público, a fim de estabelecer um percentual mínimo para os cargos concursados e comissionados da prefeitura para pessoas negras e a criação da Secretaria Municipal de Direitos Humanos para a coordenação e execução de ações integradas e transversais para pessoas com deficiência, população LGBTQI+, população em situação de rua, juventude, pessoa idosa, igualdade racial, combate à intolerância religiosa, política sobre drogas, direito à cidade e conflitos fundiários.


O candidato Ylglésio (PROS) apresenta como propostas de combate ao racismo a estruturação do conselho municipal de direitos humanos, para formular, avaliar e acompanhar políticas públicas para a proteção e garantia dos direitos humanos de grupos vulneráveis, tais como crianças, LGBTIs, negros, índios, mulheres e pessoas portadoras de deficiência, bem como para aferir e estratificar os registros de violência motivada por condição de gênero ou de raça.


Os candidatos Duarte Júnior (Republicanos) e Silvio Antônio (PRTB), em seus planos de governo, não apresentam nenhuma proposta de combate ao racismo. Ademais, chama-nos atenção que as palavras negro/negras/racismo/igualdade racial sequer são mencionadas nos referidos planos.


Vale ressaltar que os partidos de Duarte Júnior (Republicanos) e Silvio Antônio (PRTB) são da base de sustentação ultraconversadora do Presidente da República Jair Bolsonaro (sem partido). Outrossim, a ausência de qualquer menção às palavras negro/negra/racismo/igualdade racial nos seus planos de governo reflete, sobremaneira, o discurso centrado na igualdade de oportunidades e no mérito individual que procura refutar os dados da realidade e reduzir recursos públicos para intervenções de combate às desigualdades historicamente constituídas em nossa capital, bem como de negação à própria existência do racismo.


O combate ao racismo estrutural é condição fundamental para o combate às desigualdades que persistem no Brasil e em nossa capital São Luís, potencializadas pelos efeitos da pandemia do novo coronavírus. É fundamental que haja transversalidade de todas as políticas públicas voltadas para a população negra em nossa cidade, para que estas resultem sobretudo em medidas antirracistas: saúde, educação, saneamento básico, moradia, assistência social, trabalho e renda. Igualmente, é necessária a presença de pessoas negras no primeiro escalão municipal, sobretudo mulheres negras, para além dos órgãos de promoção da igualdade racial a serem criados. Por fim, nas formulações, deliberações e execuções das políticas públicas de combate ao racismo, é fundamental a participação direta de comunidades tradicionais, de povos de terreiros, de comunidades quilombolas.


As práticas de Estado que ignoram, reproduzem ou, até mesmo, ampliam a precarização da vida da população negra têm um longo histórico no Brasil. Nessa direção e no atual contexto, torna-se imperioso afirmar que as vidas negras e dos mais pobres importam e que esses grupos farão parte do contrato básico de cidadania, com a mesma garantia do direito à vida, à saúde e à proteção social da população branca.

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