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Mandatos coletivos: quais se apresentam nessas eleições de São Luís e como funcionam?

Giovana Kury

Por conta da sub representatividade na política, mandatos coletivos se tornam uma boa oportunidade para "outsiders"


Upaon Açu - De um tempo para cá, têm se tornado mais e mais comuns no Brasil candidaturas diferenciadas, que propõem uma forma plural de legislar: os mandatos coletivos. Neste ano de 2020, porém, eles se mostram em São Luís pela primeira vez - e já com certa força. Até agora, há pelo menos cinco candidaturas neste modelo, de diferentes partidos, para a Câmara dos Vereadores ludovicense.


A prática como se conhece hoje apareceu pela primeira vez no Brasil em 2016, em Alto Paraíso (GO), encabeçada pelo vereador João Yuji, do PTN - embora tenha existido algumas outras vezes desde os anos 90, em moldes menos estruturados. Nas últimas eleições, elas cresceram exponencialmente.


Segundo um levantamento da RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), de 2012 a 2014, foram sete candidaturas coletivas e 5 eleitas, já de 2016 a 2018 esse número salta para 98 e 22, respectivamente, em todo o Brasil. No Nordeste, de 13 candidaturas deste tipo, 7 foram eleitas - até então, nenhuma no Maranhão.


Diferente do que conhecemos tradicionalmente, onde cada cargo é ocupado por apenas um parlamentar, no mandato coletivo um só voto elege várias pessoas. A chapa, geralmente composta por três a cinco pessoas, se candidata e faz campanha em conjunto e, caso eleita, todos os seus membros ocupam apenas uma cadeira no Legislativo.


Para a doutora em Ciência Política e professora do Departamento de Sociologia e Antropologia da UFMA, Arleth Borges, os mandatos coletivos surgem como uma alternativa diante das fragilidades do nosso sistema representativo. Ou seja; das vezes em que

nossa democracia falha em representar a população e fazê-la participar da política.

Arleth Borges - Doutora em Ciência Política / Foto: Reprodução - APRUMA

“O que se tem é um fosso bastante acentuado entre aqueles que estão nos parlamentos tomando decisões em nome da sociedade, muitas vezes sem nenhum esforço de realmente sondar, saber e se envolver com as comunidades atingidas para saber se realmente é nessas perspectivas que elas estariam se colocando”, explica a doutora.


Esse tipo de mandato, contudo, não é reconhecido pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).


Isso significa que apenas uma pessoa do grupo é formalmente candidata e eleita, e somente ela pode comparecer às sessões e votar.

Mas, na prática, cada voto e posicionamento expresso pelo ‘cabeça de chapa’ na Casa Legislativa deve ser fruto de uma decisão conjunta entre todos do grupo.

Por não possuir amparo das leis eleitorais, os mandatos coletivos também não têm regras quanto à divisão de tarefas e de salário entre os membros, além de que, se o líder do grupo quiser ‘dar um golpe’ e legislar sozinho, ele, judicialmente, pode. Questões como essas são decididas com base em um acordo informal firmado entre eles, o que exige, acima de tudo, confiança.


“Como ainda não há uma base legal que proteja esse tipo de candidatura e mandado, envolve toda uma negociação, engenhosidade e criatividade para viabilizá-los”, discorre a doutora.


Por conta da sub representatividade na política, a maior parte dos membros de candidaturas coletivas fazem parte de minorias, que se juntam em grupo para tentar fazer com que a população representada por eles ganhe mais espaço no âmbito institucional. É comum, também, que cada membro represente uma região diferente ou atue em uma área específica - assim, o eleitorado se diversifica e, consequentemente, aumenta a chance de eleição.


Os mandatos coletivos também são uma boa oportunidade para ‘outsiders’ entrarem na na política. Em tradução livre, o termo significa ‘pessoas de fora’ e refere-se àqueles que nunca tiveram experiência partidária.





Carla Rose Tassia PT

Coletivo NÓS PT

Composto por três mulheres - a estudante Carla Alcântara, a militante Rose Frazão e a cantora Tássia Campos - a chapa Carla Rose Tássia concorre pelo PT para entrar na Câmara dos Vereadores. “Se tá faltando gênero feminino nesse poder e tá, vamos logo ocupar esse espaço com três, ainda que em um único mandato”, declararam à reportagem. Atualmente, dos 31 parlamentares da casa, apenas 3 são mulheres.

O coletivo Nós, que também é candidato a vereador pelo PT, é formado por seis pessoas - Jhonatan Soares, Flávia Almeida Reis, Delmar Matias, Eunice Costa, Maria Raimunda e Eni Ribeiro -, que moram em diferentes bairros rurais e periféricos de São Luís. Segundo eles, esses locais são deixados ao relento pelo poder público: “por isso a ideia de trabalharmos o mandato coletivo com representantes de áreas estratégicas para garantir a visibilidade que nossa população deve ter”, explicou o grupo.





Movimento Participa PT

Sou porque somos PSOL

O terceiro grupo lançado pelo PT em São Luís é o Movimento Participa, formado por quatro estudantes entre 19 e 24 anos: Bruno Cacau, Ester Lopes, Arthur Mendes e Camila Pedrosa. Para eles, o mandato coletivo não é só dos ‘co-parlamentares’, como são informalmente chamados os membros da chapa - e sim de vários setores da sociedade. “Nossa proposta é romper com o método tradicional, é reoxigenar e renovar a política, buscando a aproximação com as ruas”, afirmou Bruno Cacau, um de seus membros.

Pelo PSOL, há o Sou Porque Somos, formado por dois: Carlos Wellington, ativista LBGTQI+, e professora Dani. Para Carlos, um dos objetivos é romper com a política personalista, que põe o indivíduo do político acima da sociedade: “não é uma pessoa que vai representar. Tem todo um coletivo que pensa, formula e implementa a legislatura”.




Juntas PSOL

Elas PCdoB

O PSOL também lançou uma candidatura coletiva formada apenas por mulheres: o Juntas, de Keysse Dayane, Nuccia Kaufmann, Pricila Aroucha e Cassandra Cardoso. Keysse e Pricila são quilombolas. Uma de suas principais bandeiras é a luta pelo desencarceramento.

A outra legenda é o PCdoB, que lançou a candidatura Elas, coletivo de cinco mulheres: Josy Gomes, Luiza Coelho, Julianna Costa, Ana Raquel Farias e Jaine Santos. Cada uma mora em um bairro distinto da periferia de São Luís e promete representá-lo no legislativo. “O diferencial é a diversidade, cada uma tem sua vivência, sua bagagem, conhece as necessidades da sua região, o trabalho com certeza vai estar mais conectado com as comunidades”, afirmou Josy Gomes, co-candidata.


Estratégia de esquerda


Todas as candidaturas coletivas de São Luís vêm de partidos à esquerda e levantam bandeiras em comum, como a do feminismo, da igualdade, do antirracismo e dos direitos LGBTQI+. Na perspectiva de Arleth Borges, a maior incidência desse espectro político em mandatos coletivos se explica em uma tentativa de dar uma continuidade a uma luta já travada por movimentos sociais.


“Pessoas que já têm mais inserção em movimentos, grupos organizados, pessoas que já partem de experiência de coletividade, procuram levar essa experiência para o âmbito institucional, no caso o parlamentar”, explica.


Exemplo disso é a Mandata Ativista, primeira candidatura coletiva eleita em São Paulo para o cargo de deputado estadual, em 2018, e 10ª mais votada da cidade. Construída pela Bancada Ativista - um movimento pluripartidário para eleger ativistas - a Mandata está hoje na Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP) e é formada por oito ‘co-deputados’ do PSOL, Rede e PDT.

Dentre seus membros, há pessoas negras, moradores da periferia, uma indígena e uma mulher transgênero, todos já pertencentes, antes, a movimentos sociais. As matérias legislativas propostas pela Mandata incluem propostas para a inserção de transexuais no esporte, contra a privatização da água e a reforma da previdência e favor de direitos indígenas e de assistência à saúde mental de policiais.


“Dentro do mandato, cada co-deputado tem uma área de especialidade, e assim procuramos a orientação dessa pessoa dentro da pauta”, explica Raquel Marques, uma das co-deputadas da Mandata. “Em temas que são mais interseccionais ou que ninguém tem um acúmulo específico,(...) procuramos produzir em consenso as deliberações”.

Raquel Marques ex co-deputada Estadual  Bancada Ativista e atual pré - candidata a vereadora de SP pela REDE  / Foto: DIVULGAÇÃO - SITE

Outro exemplo é o Juntas, eleito no mesmo ano em Pernambuco. São cinco mulheres do PSOL, incluindo uma representante do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Sem Teto (MTST). Das 17 matérias legislativas propostas pelo grupo até agora na Assembleia, oito estão aprovadas - entre elas, um projeto de lei que proíbe homenagens a torturadores da ditadura militar.

Apesar da maior presença na esquerda neste cenário, em alguns estados brasileiros já se vêem iniciativas parecidas vindas de partidos de direita.


Em Recife, neste ano, cinco líderes populares da comunidade de Coque se juntaram para concorrer em uma candidatura coletiva pelo DEM.


Na visão de Borges, esse fenômeno se explica em dois pontos principais: o cálculo eleitoral, “dentro da linha de que quatro ou cinco podem obter mais votos do que apenas um”, e “agora que as coligações para eleição proporcional estão proibidas pela lei”.

Por conta de uma nova regra que será aplicada pela primeira vez nestas eleições, partidos pequenos não poderão formar time com outros para lançar candidatos a vereador. Somente as legendas que conseguirem, sozinhas, atingir o quociente eleitoral - o número mínimo de votos para eleger um representante - poderão ter um candidato eleito.


Devido a isso, é provável que partidos lancem uma quantidade muito maior de candidatos para tentar eleger ao menos um e, assim, permanecerem na disputa, inclusive em forma de candidaturas coletivas. “Então, [a candidatura coletiva] é uma alternativa que vai ganhando outras feições e sendo apropriadas para usos às vezes distinto daqueles que motivaram a sua gênese”, conclui.

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